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Lisboa / V.F. Xira / Peniche, Estremadura, Ribatejo ..., Portugal
(Maria Amélia de Carvalho Duarte Francisco Luís)

sábado, 5 de janeiro de 2008

Escancarei o horizonte

Escancarei o horizonte,
decantei águas rasgadas de todas pontes. De todas as fontes…
Abri as pernas e pari.

Eras o último amor a rasgar asas no perfil vazio do rosto da solidão. Senti os pés gelados cravados em lajeado granítico e julguei serenas raízes …
E em mim refloresceram flores, e em mim poemas ecoaram ondas rubras de sangue, suor e penas.
Escancarei astros moribundos, palmilhei despida a terra nua,
bebi lamaçal de todas as valas, de todas as valetas de todas as ruas, insuflei bálsamos de todos os atoleiros e, desmedida, abocanhei ainda estrelas na ânsia maior de ser sonho, de te dar o meu olhar de mar risonho, de te dar o meu colo aberto e, em mim e de mim, jorraram bocas franqueadas no pavor inóspito de escalpes arrancados às virgens madrugadas.
Caladas!
E os silêncios ecoaram hipnoses, e os poemas dilaceraram sílabas desvalidas de tão perdidas, entre o hipotálamo e a hipotenusa do círculo vicioso da tua vida.
Da tua vida…
Busquei o sagrado no sangue derramado em cruz, bebi do cálice da minha própria dor e fui tua.
Era nesse tempo flor.
Flor incerta de pétalas assépticas, marginadas cérceas à margem do desamor.
Coloquei um lençol de linho na minha cama de mulher, ungi o corpo no perfume esguio, no fio de uma roca por tecer e, semi-deusa, submergi e esperei que sobre mim, que sobre ti, que sobre nós, descesse o Sol das searas de trigo por colher. O azul da luz…
No leite dos cactos e das piteiras embriaguei a solidão da espera de uma vida inteira.
E os meus seios foram teus outeiros em deleite do acontecer.
A noite chegou em gritos amordaçados e os corpos não se ajustaram grudados, nem as bocas, nem os beijos, nem as águas se amancebaram nos seixos perpetuamente rolados, do rio ao mar.
… do rio ao mar!
A noite chegou sem a tarde acontecer…

Escancarei os horizontes,
as sílabas subiram, descendo os montes, em hecatombes de claridade, desaferrolhando silhuetas de pássaros por dentro de todas as chagas. Voaram-se para além de si. Perfuraram penumbra adentro… por dentro de mim, por sobre ti, quebrantados, não mais que amantes pulverizados no desenlaço de em si volver.

São agora sonhos que um dia pari e que vi morrer.
***
in "Textos Esparsos" © Todos os direitos Reservados

“𝕮𝖗ó𝖓𝖎𝖈𝖆 𝖉𝖊 𝖚𝖒 𝖈𝖍𝖆𝖕é𝖚”

“… palerma, chapéus há muitos”… Haver há, de certeza absoluta. Nem contesto. Mas não são meus e nunca estabeleci com eles uma relação...