Sobre mim ...

A minha foto
Lisboa / V.F. Xira / Peniche, Estremadura, Ribatejo ..., Portugal
(Maria Amélia de Carvalho Duarte Francisco Luís)

terça-feira, 30 de junho de 2009

Gotas de cristal, orvalho, prata...

Desces serena pelo beiral da minha vida, gota de chuva, gota de prata, límpida, na beleza de um puro cristal. Lágrimas soltas no alcantilado gélido da noite.
Abro os meus galhos e acolho-te...

Sou árvore, sou flor, sou pétala, que, em ressupinação te aguarda e que, da tua visita, se purifica.
Sou a semente perdida de uma margarida...

Sou da flor, uma simples micro-pétala que, nesta espera, tão infinitamente alongada, se queda, comprimida contra as margens de um rio que transborda e que tudo alaga, na lágrima salgada. Rio veloz do leito até à foz. Rápido em sentidos desmaiados, a/enunciados, em tantas e tantas palavras, recalcadas na boca, retraídas entre o palato e a língua...

Sabes gota, hoje vou viajar nas tuas asas, vou percorrer o vento suspensa no teu voo secreto. Tu, que tens a capacidade de te transformar do estado líquido ao gasoso e sob o impetuoso frio glaciar... gelar, solidificar. E, como como tu... gota serei. Solidificarei, na recta final Catedral de Gelo, tal as do Lago Superior do Canadá.

Ficarei, que eu sei, com os sentidos mordidos pelo frio. Percorrerei inóspitos lugares, periclitantes, em gélidas paredes recobertas no meu próprio gelo – que gelada se anuncia a vinda do Inverno -, procurarei ai, nesse Universo de quietude e de brancura, a Paz... a Paz que tarda.

Sim, em mim própria serei a água e o alpinista escalador de gelos.

Colocarei os piolets, camelots, crampons, eriçarei os pés em picos... extensões dos meus próprios sentidos.

Sim, não sei na verdade se usarei sequer cartas sinópticas... navegarei apenas ao sabor do sentimento... sem recurso a mais “ferramentas”... Medirei, contudo, os teus secretos ângulos, que juro até comprei um Clinómetro...

Aguçarei a arte e o engenho, na eterna procura da sensibilidade dos sentidos.
Inventarei novos trilhos, nos trilhos da sólida água – que em ti adivinho... gota.

Gota de Prata... gota de orvalho ou de cristal... a mesma, a que tomba agora rumo à boca, em correria, tão, mas tão louca, que simultânea, me beija e me afaga...

Procuro em ti, gota, como te digo, caminhos! Caminhos que me conduzam ao cume, ao cume mítico da Montanha Mágica.
Caminhos de inovação e de atrevimento.
Caminhos de protecção e discernimento... de pureza e consistência...
Gota, parede de cristal.

E te encontro, e me encontro, entre o fim da noite e o início da madrugada, nesta eterna escalada, ao epicentro de mim.
Esta escalada que me obriga a escutar, a ler o que me habita...

Muno-me de cordas e de archotes, desafio a verticalidade, procuro-te e procuro-me.
És a certeza reencontrada na palavra Saudade.

E no negrume da noite, vislumbro-te, gota, estrela a pontilhar de luz a lua, a lua negra e fugidia. És de mim o farol, a guia, o anjo que sem que me toque me transporta a este abismo que sou, dentro do meu próprio corpo: mar tumultuoso, revolto...

Oceano sem fim, onde apenas o simples brilho de uma só gota, me ilumina e me conduz, me alumia, me reconforta, me fascina.
Gota de cristal, de chuva e prata!

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Escrito em Lx. 25/X/2006, Publicado aqui

terça-feira, 23 de junho de 2009

Poderia dizer-te, palavras que nunca te direi ...

Poderia dizer-te
dos pássaros mortos que encontrei naquele dia quando abri a porta da casa fechada há alguns anos. Do dardejar de suas asas por dentro do meu peito…
Do pó que contornava cada canto, cada estrado, cada flor inanimada p’la secura. Ou ainda da água enferrujada que, ao abrir a torneira, tingiu de ocre meus dedos.
Poderia falar-te do relógio de cuco que me olhava, como dantes, por entre as duas portas das salas. Mudo, contudo. Enclausurado no escuro do seu mundo …
Do lambrim do hall de entrada feito a custo - era tão escasso o dinheiro naquela altura -, por um artista da época sobre o estuque fresco, num imitar perfeito, dos nós, dos lenhos, dos veios, de troncos de madeira. Entroncados, ombreados, uns nos outros.
A inspiração viera-lhe dos tempos em que, como estivador, viajara nos porões dos barcos, onde à chegada, descarregava em ombros o que o navio levava, pelos portos de Lisboa a Veneza …
Poderia dizer-te
de como cresci ali, naquela casa, agora abandonada; onde aprendi a ouvir os cantos de todas as aves e mais uma: domésticas, de gaiola ou até capoeira. E daquelas que me visitavam p’la manhã e p’la tardinha e trinavam só para mim, então menina, cânticos em códigos só nossos.
Quase divinos, digo-te agora.
Eram, de todas, as que mais apreciava. Respiravam liberdade e, sem que ninguém soubesse, traziam-me notícias dos que no antes de mim, haviam rumado mundos ao mundo …
Dos que os vivos, diziam que estavam mortos (não nunca em mim ...).
Só a carne, porque o que deles emanara, perdurava na matriz cristalina da minha alma … cada gesto, cada palavra… até o barulho distinto dos passos … e a todos amava. E com todos me amparava … tios velhos, vizinhos, avós e primos …
Poderia dizer-te
da companhia que me fizeram os meus bichos (e tantos eram). Os da seda, que alimentava com folhas verdes de aroeira ….
o meu ouriço-cacheiro com quem me cruzei um dia e, num ápice tresloucado, salvei da roda de carro. Depois, afaguei-lhe os espinhos, alimentei-o a pedaços de pêras, de maças, que desviava da cozinha até ao dia em que, provavelmente cansado de tanto desvelo e afago, se escapuliu sorrateiro em busca do seu destino….
Deixou-me, tal como tu, uma lágrima silenciosa… e a percepção de que na vida, tudo o que chamamos de nosso, é efémero, transitório… dura enquanto dura. Apenas isso!
Ou dos porquinhos-da-índia … mal cheirosos, eu sei. Mas tinham um pelo tão lindo e um olhar que me esquentava a alma, de um castanho melado …
ou ainda dos outros, os da pocilga, que viviam e morriam para que eu pudesse viver… transitória a sua vida, mas amava-os de igual maneira. E tratava-os se adoeciam. Por eles aprendi até a dar injecções … a eles, e às ovelhas… aos gatos e aos cães; e mais houvessem, trataria de igual maneira …
Poderia ainda falar-te
do dia em que as águas subiram e, quando acordei de manhã, na beira rio e por todo o lado, só se viam destroços do que foram vidas dos que comigo comportavam, sem comportas ou barreiras, nas aldeias lado a lado.
Do dia em que tremeu a terra, em que dos altares do céu, os deuses se exaltaram… e que, na mesinha de vidro, um peixinho de barro, tilintou-me o aviso … acreditarias, pois?
E na verdade assim foi!
A um peixe de barro a uma mesa de vidro, devo o facto de ainda estar viva …
Poderia contar-te ainda
dos dias em que o despudor dos homens retalharam no toque e no abuso a inocência do meu corpo, tomando os botões de rosa que anunciam os seios, no argumento de que eu, a criança, era a “feiticeira” …
Se consumado o acto? Não! Sabes… Deus devia estar por perto…E alguém me libertou na hora derradeira...
E desta mágoa, que até hoje perdura, do quanto me senti impura. E do nojo que sentia …de um bafo que fosse, de ver um homem a menos de meio metro… insegura, sim!
Poderia contar-te
se a pressa não fosse sempre o teu maior alimento, de como cresci por fora, de uma beleza trigueira, nesta altivez de porte, neste olhar que intimida… E resiliente a outras quaisquer emoções, que não a partilha inteira com a natureza primitiva de plantas e animais …
Em suma, poderia ter-te contado a história da minha vida até ao dia em que a força centrípeta te colocou nuclearmente no certo do meu destino. E me fez confiar, acreditando, que o amor que emergia, que tão profundamente sentia, bastaria para nós dois …
se te amava de forma desmedida, de forma incontrolada …
se te daria a chave e o cofre de todos os alfabetos. Se te sonhava acordada, e me via solta e livre, em loucas correrias por serranias e prados...
Eram os teus braços que buscava. Tão-só e apenas... sem porquês, indagações, reticências, pontos finais ...

Poderia sim…
Todavia, em certos momentos, duvido até que, aos teus ouvidos, as minhas palavras tivessem o mesmo efeito que uma missa dada nos dias de hoje, mas liturgiada em latim… abanarias a cabeça, e dirias "amen", que sim…
Assobiarias e passarias adiante … ou estou errada e me ouvirias atentamente?

Diz-me … o cansaço está, definitivamente, a tomar conta de mim!
... Fazes-me falta, preciso de ti!

terça-feira, 16 de junho de 2009

O Sonho de Deméter

Deméter, era vizinha de Antonino, a dois passos de Antonino, quase que lhe podia sentir o cheiro a lavanda.... Também ela era tímida, reservada, até mais do que isso, aparentemente congelada. Congelada por séculos de espera e de solidão.

Aí, um dia conheceu Antonino. De mansinho, percebeu que não estava mais só. Fora o olhar dele, um olhar queixume, foram os passos baloiçantes, leves, carregados de magia e de voos prometidos, ou apenas o som de batuques ao longe, não sabia!

Sabia apenas, que deste esse dia, se havia, para sempre, consagrado a ele. E, sem que ele soubesse ainda, lhe oferecera o seu olhar em forma de poema e com ele colocara estrelas no firmamento, guias, por onde um dia, igualmente sem saber, Antonino se haveria de projectar e viajar nas palavras.

Deméter não tentou impedir-lhe o voo!

Adorava vê-lo voar, asas abertas, num voo agitado, às vezes, acalmado outras, picado, noutras... Asas abertas, sem destino obrigatório, é certo.

Mas sabia que a todas as Primaveras, Antonino voltaria.
Voltaria para sorver o seu olhar maresia, o seu olhar poema. E com ele preencher telas infinitas de um amor maior que o espaço!

Da sua janela, vira Antonino a plantar pimenteiros nos passeios e percebeu. Então queria ele que provasse o picante-escaldante da vida? O picante da Paixão? Pois seria! Antes que a polícia chegasse e arrancasse um a um os pimenteiros, pela calada da noite apanhou as malaguetas coloridas de vermelho, macerou os frutos no mais fino azeite! Com este ópio se unge e se purifica, nas horas em que, sob a lua crescente, na magia das palavras, ambos se encontram e se amam perdidamente.

Deméter conhece-se-lhe todos os trilhos, todos os atalhos e isso faz dela a mais amada das mulheres!

Sim, também ela de amada passou a abandonada. Mas só fisicamente... Vive uma vida nova, sem incertezas. Tem as suas rotinas ... e, uma delas, é a de, todas as manhãs, procurar o seu Pólo, um cão que a acompanhou durante anos, fiel, e que a ajudou a manter acesa a esperança de vir a ser, um dia, apenas gente.

Deméter voa agora, suspensa nas asas do seu Anjo!

Recorda o tempo em que as asas estavam coladas ao corpo, como que incapazes de gerar afagos... Mas Antonino passou por perto e, como que por magia, o corpo estremeceu e o milagre da vida (uma nova vida) aconteceu. Deméter renasceu em Maio! E percebeu que uma ave a voar parada pode ser uma ave morta e não quis voltar.

Diz quem viu, que hoje, no céu estrelado da noite, voam dois pares de asas, tão, mas tão fundidas, que não se sabe onde começam umas e as outras acabam.

Deméter já não tem só sonhos. Vive o sonho!!!!

Sabe que a vida que vive agora, num voo supremo, é bem melhor que sonhar, aprisionada que estava num corpo de vidro fino!

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Conto originalmente publicado aqui

Nota:
  1. Démeter
  2. Antonino (inspirado no "conceito" de vias romanas ... caminhos ..."Itinerarium Antonini")

sexta-feira, 12 de junho de 2009

No Jardim da (i)lógica

Naquela noite, o mar estava incendiado. O Menino aguardava a vinda da sua Fada, por detrás da janela, olhando-o de frente. Tanta gente, tanta gente, e, contudo sentia o seu coraçãozinho demasiado sozinho .

A sua Fada, aquela que chegava quando o dia se despia e ele vestia o pijama do avesso, tinha o condão de lhe trazer uma Paz e um bem estar de que tanto necessitava para enfrentar o frio da madrugada. Tantas perguntas, tantas questões para lhe colocar. E, contudo, pressentia que haveriam muitas, às quais ela nunca iria responder ... ou talvez sim!

Na última noite a Fada quando se despedira, havia-lhe dito:

“Descansa meu tonto... acalma esse coração ... sente o marulhar das vagas, o rebentar das ondas nas falésias, deita-te na areia, encosta o ouvido bem sobre ela... e ouvirás o respirar da Terra. Ouvirás, que lá dentro, ela, como tu, tem medos e treme, ela, como tu, sorri e chora ...

A terra vive, cresce e evolui, tal como tu, tal como as estrelas e os planetas ... tudo tem um principio e tudo cessa e, de novo tudo recomeça. Um circulo contínuo!"

Tal como a Fada lhe dissera, deitara-se de barriga na areia, colocara o ouvido atento no seu ventre e, jurou que sentira a Terra a soluçar, a tremer e a vibrar ... com tanta, tanta força que se levantara de um ápice e correra saltando de vaga em vaga, envolvendo os pés e as pernas, envolvendo os calções e a camisola de espuma ...

A Terra chorava? A Terra sofria? A Terra...

Sempre pensara que só os animais tinham sentidos (sentimentos, não era isso?). E agora concluíra que ventre da Terra, lá no fundo, tal como uma criança ainda dentro do ventre de sua mãe, a Terra, ela própria, borbulhava e fervia ...
Porque choraria a Terra?

A sua Fada não chegava ...
Olhou de novo, uma e outra vez através das cortinas do Tempo... olhos com os seu olhos cor de Terra ... E, como por Magia, como respondendo ao apelo do seu coração, a Fada vinda do Jardim dos Deuses, materializou-se, vestida das cores do arco-íris... num sorriso de Luz, na melodia de harpas e flautas ...

O quarto era agora um lugar mágico. Sem mais, sentiu o beijo sereno de que já se habituara a tombar sobre a testa, no centro do seu espaço visual, sentiu-lhe as mão que o afagavam num abraço eterno. Sorriu....

- Fada... hoje pensei que já não vinhas...

- Meu querido, virei sempre, mesmo que os teus olhos me não vejam, o teu coração e a tua Alma saberá que estive aqui...

- Mas eu quero ver-te! Quero ...

- Querido ... nem sempre aquilo que nós queremos se pode obter. O que importa é que nós tenhamos a consciência que desenvolvemos todos os esforços para o conseguirmos...

- Sabes, Fada, hoje queria falar contigo sobre o que me disseste no último dia, quando me falaste de que a Terra sofria ...

- A Terra, meu querido, é um ser vivo, e como tal, sofre as maldades que os humanos fazem com ela… o desrespeito pela Mãe Natureza, como por todas as mães do Mundo, é sentido no ventre da Terra … quando o Homem não respeita os ciclos da Vida … esgota os recursos (destrói florestas, captura espécies animais em vias de extinção, quando pesca em épocas de reprodução, etc …), meu querido, isso faz a Mãe Natureza sofrer …

- Fada… eu nunca farei nada disso … prometo!

- Eu sei, querido … descansa agora…

- Sim, descansarei … conta-me então uma história … aquela do Jardim da Ilógica … não era assim que se chamava?

- Meu querido, essa já te contei … até já contei na net …

- Na net ? ... Fada!!! Tu tens net no teu Reino?...

- Tenho sim, meu querido … escrevo histórias … lá sou só contadora de Estórias (sem H ”… e com um “E”)… A Meldemim. Apenas para ti, Karmel ...".

- Só para mim !!!! ... Fada … isso está mal escrito …. Estória ? Ehhhh eu sei que está… Histórias é com H e com um I …

- Talvez meu querido … mas estas são de uma Fada para o seu menino, são Estórias (I)Lógicas … ora ouve então:

"Uma Rosa & Um Sapo"

“Era uma vez um sapo que vivia no Jardim do Éden. Tinha sido vítima de um feitiço, e por isso continuava ali, camuflado entre a folhagem verde, esperando o dia em que ela (a folhagem, claro) se transforma-se, amarelece-se e, assim ele, o Sapo, se pudesse revelar. Era um belo sapo... O tempo passava, sem que o Outono chegasse, o verde exuberante matizava a Primavera e perpetuava-se no Verão …

O Jardim, resplandecia em todo o seu vigor. Túlipas, dálias, amores-perfeitos … e rosas! Milhões de matizes e um Sapo, verde …


Assim decorria o tempo. Lento … O Sapo desanimava… Mas, vá-se lá saber porquê, durante a longa espera ...o Sapo apaixonou-se (coisas de animais) por uma Rosa do Jardim do Éden. Era uma rosa-espinhuda, uma rosa solitária. Vivia suspensa numa roseira mesmo na beirinha do lago habitado pelo Sapo … Gerou-se entre eles uma química (sabes o que é química, querido?... atracção, partilha de emoções ...sim, eu já te disse que no Jardim da (I)lógica tudo é possível ...e, não te esqueças, era ai que ambos viviam ...).

Se a Rosa o amava? Dizem que sim... Mas a rosa tinha espinhos, o sapo escorregava... Se algum dia o caso se resolveu?...

Espera, tenho sono... Pensando bem, talvez ta conte noutro dia.
Dorme agora, dorme bem, meu Pequeno Príncipe... chove lá fora, torrencialmente... Ou será dos olhos meus?
Dorme agora, Príncipezinho ...


E dizendo isto, aninhou-lhe a roupa, acariciou-lhe os cabelos, depositou-lhe ao de leve um beijo e partiu. Levava no olhar um estranho brilho ...
Seria que o seu pequeno príncipe alguma vez descobriria quem era a "Rosa"? ...

Para além do Infinito está agora a Fada Karmel ... escreve na Net uma outra Estória ... sobre Cães e Pessoas-Cães. A que irá no próximo fim de dia contar ao seu menino ...

___***___

Era assim... faz algum tempo, quando a Mel escrevia em O Melhor de Meldemim, Feiticeira (rsrrs)

domingo, 7 de junho de 2009

"in Pulsos..." nossos ...


Aconteceu ontem, ao fim da tarde. Lisboa, Campo Grande 56...

Ali, entre um auditório cheio de amigos de vários quadrantes, Cleo deu à luz o seu filho literário primogénito. A mim coube-me a muito honrosa tarefa de o "amparar" com as minhas próprias palavras.

E, porque o fiz com muitíssimo prazer e grande amizade, aqui vos deixo esta nota, caríssimos leitores e o esboço de que me socorri para o momento ...
***

.... Em primeiro lugar cabe-me agradecer veementemente o convite que a Cleo (Lurdes Dias), me fez para, neste dia especial para todos nós, seus amigos e companheiros de palavras e, muito em particular para ela (o Lançamento do seu primeiro livro), estar aqui a seu lado e não ai, na plateia, onde certamente estaria de igual modo...

De seguida, agradecer a todos vós, a presença. E, claro, e não menos importante, à Editora por ter convencido, sublinho… convencido a Cleo a sair da tela e dar-nos o prazer de a ler num qualquer lugar …

O livro é e será sempre um dos principais canais de aproximação entre o autor e o leitor… sem esquecer que ainda existem muitas e muitas pessoas que não dominam as novas tecnologias …

Posto isto, apenas uma pequena nota pessoal, e, de imediato passarei ao “busílis da questão” que é como quem diz… falar da Cleo e da sua obra…

A tal nota: A Mel (eu) e a Cleo (ela), cruzaram-se um dia no blogoesfera…
tinham outros nicks, como é natural nestas coisas...

A Cleo, Medusa … quanto a mim….Sorry … esqueci… e, em rigor também pouco importa, na medida que é da Cleo que hoje queremos saber.

Apenas fica o registo e o sublinhar que, se hoje a Mel tem poemas em várias Antologias, livros publicados, mais de mil poemas registados, etc... deve-o, em boa parte a esta amiga, que, desde o primeiro instante a impulsionou a publicar… a aderir a sites…

E destas coisas se fazem amizades,
e destas coisas e nestas coisas se definem as pessoas …
cumplicidades, partilhas, valorização do outro, generosidade.
Coisas tão inversas a mesquinhez e a invejas pequeninas…

Eis pois, em traços largos aquilo que ao longo destes cerca de três anos encontrei na Cleo… no seu carácter, no seu modo de estar e de ser ...

Repito, sintetizando: Desprendimento, generosidade, simplicidade …

Agora então o tal “busílis da questão” … Falar da escrita da Cleo.

Agora, meus amigos, companheiros de e nas palavras… é aqui que - usando uma expressão popular - , perdoem-me “a porca troce o rabo, se rabicha não for” … podem rir, eu “autorizo”, não esqueçam pois que, tanto a Cleo, como eu mesma, somos de aldeias e/ou crescemos em aldeias… e lá e por lá a sabedoria popular impera …

Pois é… Lamento... mas pouco ou nada há a dizer sobre a escrita da Cleo…

Ou melhor… eu, a tal "prolixa Mel", não tenho, não encontro, palavras melhores para classificar, definir, catalogar a escrita da Cleo, se não as suas próprias…

Ora permitam-me então que a leia, em prosa:

“Simplicidade das palavras” … pág. 15 …

“Hoje alimento-me das palavras, a maior parte delas, encontro-as escritas, nos mais variados sítios por onde me passeio nos fins de tarde dos dias mais ou menos vazios... ou pelas madrugadas fora, na ausência das horas que me controlam, mas que por um qualquer motivo, ficaram presas no relógio pendurado naquela parede branca atrás de mim e para onde nem sequer olho...
Palavras escritas, faladas ou ouvidas, são palavras que definem sentimentos. Podem confortar, alegrar, dar esperança ou tirá-la… podem excitar, insinuar, esconder ou mentir. São apenas palavras…
Algumas dessas palavras são tão belas, que me recuso a colhê-las para mim, deixo-as ficar no mesmo sítio, para que possam ser admiradas por todos os olhos que as encontrem também. Outras são demasiado caras, sempre o foram e só com um dicionário por perto, as conseguiria alcançar, mesmo não sabendo muito bem o que fazer com elas... por isso nem sequer lhes tento chegar perto. Outras ainda, são demasiado floreadas e engenhosamente complicadas de modo que de nada me serviriam também, por isso, deixo-as para os entendidos. Há ainda aquelas, que me acenam com sorrisos, mas são demasiado oferecidas, não as levo, deixo-as ali, para que outros se sirvam...
Há também aquelas que magoam, que me ferem os sentimentos e me entristecem profundamente… não as quero, não as desejo nem as ofereço a ninguém. São horríveis!
Sou esquisita, só gosto daquelas outras mais simples, que me enchem o olho logo no primeiro encontro e é dessas mesmo que me alimento e as devoro logo ali, naquele preciso momento.
Hum... que delicioso banquete este, de palavras suculentas e cheias de vitaminas, que me satisfazem e me dão um novo alento. Mas as palavras não são tudo..."

Não, de todo não, caríssimos senhores aqui presentes. As palavras são importantes, em certos casos determinantes, mas não são tudo.

Mas das de Cleo dizem
tudo ... (ou quase tudo dito)…

A prosa de Cleo é uma limpa, clara, sem subterfúgios, sem pedantismos, e porque assim é, chega-nos ao mais profundo de cada um de nós, provocando reflexão… provocando vontade de retornar ao ponto de partida e reler…

.... (desde sempre lhe disse que era fã da sua prosa … )

E quando a lemos num outro registo? Como se expressa, como se manifesta, Cleo em poesia?

De novo … nada a dizer: A Cleo deixa que a sua escrita fale mais alto e nos cale para que a possamos, atentamente, escutar:

Atrevo-me a lê-la …
(perdoa, Cleo, mas sou amadora nestas lides …)

“Divagações sob uma folha branca …” – pág. 42

Soubera eu
Ser poeta
Ou poetisa
Como também se diz

E não me desolaria tanto
Com o branco
Desta folha nua...

Talvez escrevesse sonhos
Desejos
Magias
Segredos
Ou degredos
Que por vezes
Me povoam
Os pensamentos
E me adornam os dias
Até os mais cinzentos

Porém...
Não sou capaz!

A poesia
É dos que a transpiram
Que a fazem sua
Nas madrugadas claras
E caladas
Sejam Verões quentes
Ou Invernos chuvosos e frios
Não importa muito...
O que importa sim
É o acto em si
Em que o poeta e sua amante
Se embrenham um no outro
E se entranham
Consumando aquilo que alguns apontam
Como um acto ilícito
Mas que importa isso?!
Se eles o fazem
Ali mesmo
Sem pejo
Nem preconceitos
Sem testemunhas
Que os incriminem!...

Não...!
Desenganem-se aqueles
Que a pensam sua
Só porque a roubaram dos outros
Os desacautelados
Que a deixaram ao abandono
Num qualquer algures
Mas que a reconhecem de imediato
Mesmo que vestida de outra cor
Que não aquela com que a deixaram
E que a sabem sua
Para todo o sempre
Esteja ela onde estiver!

Mas também não é daqueles
Que a desprezam
Com crueza
Com frieza
E arrogância
Logo após a serventia
Qual prostituta barata
Da antiga rua direita
Da cidade de Coimbra...

E com tudo isto
Só agora reparei
Que me enrolei
No fio da meada
Que me trouxe até aqui

Foi já tanto
O quanto divaguei
Que me esqueci
E já não sei
Ao que realmente vim!

Ah! Já sei!
Dizia eu...
Que talvez escrevesse sonhos
Desejos
Magias
Segredos
Ou degredos
Mas porque será que não consigo
Derramar nesta simples folha
Tudo isso?!
Fogem-me as letras
Das palavras doces
E fico sem saber
Como as escrever...
Por isso
Fico-me com a raiva
Presa ao que não escrevo
E ao azedo
Do arroto que me saiu sem querer

E fito a folha
Que me sorri com desdém
E que continua aqui
Bem diante de mim
Assim... despida...
Sem vergonha
Nem culpa
Visto que essa
Essa...
É só minha!"

Por fim, e para não vos cansar, vejamos este outro poema, partindo do seguinte questionamento:

O que faz a Cleo com as “horas que lhe sobram”?
… sobrarão muitas horas a quem trabalha, a quem é mãe, a quem é mulher? … À partida não …
digo eu ...

Todavia

deixo-vos a resposta de quem sabe que o tempo tem um tempo de ser tempo e que, o que deixamos escrito perdura muito para além de nós, perdura ad eternum…

“Nas Horas que me Sobram” …. Pág. 28 …

Nas horas que me sobram
Dos dias que me fogem
Procuro o que me escapa
Nas entrelinhas do que escrevo...

São pequenos detalhes
Das coisas que não vejo
Mas que pressinto...
Estão lá
Em cada vírgula que não meto
Em cada ponto final que não uso
Até nas interrogações que por vezes me faço
Nas afirmações que admito
E nas reticências que me denunciam...

É este o meu livro
De matéria virtual
Que escrevo em tela negra
Sem festa nem pompa...
À mercê de um qualquer vírus
Que o apague dos registos
Ou o leve sem destino...

Não me importo
Escreverei outro
Tenho tempo...

Até que alguém se lembre
De me obrigar a parar!"
***

Posto isto, palavras minhas para quê, meus amigos?

As da Cleo são, indubitavelmente mais fortes, mais reveladoras, da sua obra e da sua pessoa…

E, tal como dizia Alçada Batista que, infelizmente não está mais entre nós, “melhor que qualquer biografia ou até autobiografia, a obra do autor…”

Partilho o pleno desta afirmação. In pulsos, em formato livro, fala sem necessidade de imagens ou sons (a que a nossa Cleo se socorre nos seus blogs e que lhe conferem uma tónica muito própria, sem dúvida...). In pulsos em formato papel, basta-se a si, pela força da palavra.

In Pulsos é, em suma, e no meu entender, uma obra vestida de uma enorme e genuína simplicidade, quer linguística quer estrutural, e, por essa razão, muitíssimo bela.

Bem-hajas Cleo por nos teres dado este presente!

***
Foto: "roubada ao bloguista "Rouxinol do Pomar"... Obrigada Sr. Rouxinol ...

quarta-feira, 3 de junho de 2009

"Quem acrescenta um ponto" ...

Foi com imenso prazer que recebi o convite por parte da Esc. Sec. Avelar Brotero (Coimbra), no sentido de integrar a Antologia "Quem Acrescenta um Ponto" (um projecto que pretendiam levar a cabo e que reuniria trabalhos dos seus alunos e de alguns autores que estes haviam encontrado na net e que apreciavam).

A escolha foi totalmente da responsabilidade dos mesmos, sendo a única condição que coloquei, a de que, os "contosdemulheres" não fossem usados dado que, espero seja o meu próximo livro.

Projecto concluído, "Quem Acrescenta um Ponto" é uma obra que honra a juventude envolvida e me honra particularmente pela escolha do texto ... um texto alusivo à terceira idade.

"Marcos Falos", aqui publicado, é então a selecção dos alunos e da Escola.

Resta-me agradecer publicamente e desejar-vos, jovens escritores e corpo docente envolvido, e claro à Temas Originais (editora) muitos e muitos projectos similares.

A Mel estará sempre disposta a ceder trabalhos.
Por causas destas e, em especial, por causas sociais. Não hesitem em contactar-me.

Contém sempre com o meu apoio incondicional.

Grata
Mel



“𝕮𝖗ó𝖓𝖎𝖈𝖆 𝖉𝖊 𝖚𝖒 𝖈𝖍𝖆𝖕é𝖚”

“… palerma, chapéus há muitos”… Haver há, de certeza absoluta. Nem contesto. Mas não são meus e nunca estabeleci com eles uma relação...