Na
deriva dos dias emerge o cume de um tempo
De_ gelo. Um glaciar
sem nome sustido na corrente sanguínea, a atropelar cada nanossegundo de um
chão lunar em que, de pó de nadas, se faz o espelho em que aposto a cara.
Retalhada, a imagem de mim não mais é do que a de um corpo chamado palavra e
nele, no corpo que entrego rendida aos signos, cada letra luta agora por um
novo posicionamento. Como um puzzle de que se perdeu a identidade ou que perdeu
a lembrança original de si, e onde as peças, atulhadas por prazos infindos em
caves escuras e expostas ao salobre e ao bafio, se esfarelaram per si em redemoinho de vísceras frias e
poses deíficas, numa tentativa vã de danças acrónicas. Como um astro que
aparece em lugar oposto ao Sol.
Nada subjaz à mandíbula
impoluta do gelo. O corte entre o antes e o agora atravessa as crostas mais
íntimas e espessas, retalha-as sem dó nem piedade e a literatura em estado puro
do que foi um dia o livro de Génesis deposto em tuas mãos, nega-se a regressar
à claridade. A subida de tom das falas perdidas em silêncios calculistas
afectou o equilíbrio das pedras de que se fizeram as paredes de gelo e nem a
nova água que chega de todas as chuvas tem capacidade de ser absorvida - apenas
e só gera, no mar das nossas vidas, a subida das marés.
imagem da net.