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(Maria Amélia de Carvalho Duarte Francisco Luís)

terça-feira, 27 de maio de 2008

"Tara perdida".

Existem momentos em nossas vidas que jamais conseguimos esquecer. Ou porque foram de tal modo dolorosos ou pelo seu inverso. Ou simplesmente porque nos fizeram, como neste caso, sorrir por dentro e nos marcaram.
Corria o verão de 1991, julgo não me falhar a memória. Num daqueles dias em que uma boa esplanada ao pé do mar nos chama mais do que qualquer outro lugar.
Mas não, fossem quais fossem as razões, a família estava reunida em torno da mesa e almoçava placidamente, num daqueles almoços que parecem não ter fim, acima de tudo porque o não desejamos.
As crianças, filhos e sobrinhos, brincavam alegremente, sujavam-se e espalhavam os sumos por cima deles e das mesas. Não adiantavam ralhetes, eram pequenos de mais e estava-lhes na massa do sangue.
Sobre a toalha de xadrez garrafas vazias contavam a história líquida daquele dia.
A determinado momento a minha filha Rita, então com 7 anos e a frequentar a 2ª Classe, fixou-se em leituras de rótulos e embalagens. Até ai nada de estranho. Quem a conhecia sabia daquela “queda” para as leituras em tudo o que era sítio.
As conversas cruzadas, as piadas e as graças continuaram entre nós, os adultos e, entre as crianças a atenção prendia-se em torno das leituras da Rita.
De repente o seu rosto ensombra-se. Os olhos, imensamente verdes, abrem-se de espanto e cobrem-se de uma névoa a ameaçar tempestade… Como íman, todos olhámos em sua direcção. Eu, em especial.
- O que foi filha? Não sabes ler alguma coisa? Posso ajudar?
Abanou veementemente a cabeça e uma lágrima ameaçou rolar o rosto. Mais inquieta ainda insisti:
- Diz lá filha, que foi? Que tens?
A Rita pegou na garrafa à sua frente e deu-ma:
- Mamã… “Sem retorno. (es)Tara perdida". Tá perdida mamã… tá perdida, como o mano se perdeu na praia naquele dia …
“Sem Retorno. Tara perdida”.
Escusado será dizer que levei largos minutos a tentar acalmá-la. A tentar explicar o sentido de “Tara perdida”. E a fazê-la entender que as garrafas nunca seriam “crianças perdidas”. Eram seres sem alma, apenas matéria. Vidro no caso, sem retorno e sem valor se devolvido. Restava reciclar e nesse tempo o conceito em Portugal ainda era muito pouco difundido. Definitivamente, a nossa garrafa estava perdida.

“𝕮𝖗ó𝖓𝖎𝖈𝖆 𝖉𝖊 𝖚𝖒 𝖈𝖍𝖆𝖕é𝖚”

“… palerma, chapéus há muitos”… Haver há, de certeza absoluta. Nem contesto. Mas não são meus e nunca estabeleci com eles uma relação...