Sobre mim ...

A minha foto
Lisboa / V.F. Xira / Peniche, Estremadura, Ribatejo ..., Portugal
(Maria Amélia de Carvalho Duarte Francisco Luís)

sábado, 28 de março de 2009

Rotas de sal


Lisboa, latitude de 38º 4´N, longitude 9º11’ Oeste de Greenwich

“Correspondência ao mar”. Largo o livro. Vitorino a meu lado. Hoje e ontem. Como naquele dia em que to li em páginas abertas de mim própria. O guardanapo: Branco, inconcluso, amplo. Sobre a língua a navegar, um alfabeto de palavras nunca ditas. E outras, as des_ditas. As rotas, as rotas - maltrapilhas de tão safas -, boquiabertas as palavras. Como as pessoas que, como eu, ainda se espantam de si.

A esplanada está deserta. Já todos foram, a cidade não espera por quem não se apressa… A cidade devora-se na pressa das horas postas. Devora-se nos relógios de cuco.
Nos relógios de sol e na escuridão dos rostos.
Taciturnos. Inoportunos. Não se vislumbram sorrisos. E, contudo, falam que é Primavera. Será que é noutra latitude e não aqui? Olha-me o mar como que em formulação de pergunta: não tens pressa?

Não, não tenho pressa. Em rigor nada tenho por fazer. Reformei-me faz tempo. Aposentei-me, como fica bem dizer… Agora sou dona do meu tempo. Mas não de mim… Estranha a forma como me vejo. Branca, enrugada. Como esta folha de papel a que, por pudor, não toco. Dobrada em forma de triangulo no copo ao lado. O teu lado. O teu copo. O teu corpo. Guardo-te. Guardo-te em mim. Borboleta sob copo de vidro perdi o fulgor das asas. Morri…

Escrevo-te.
não sei porque te escrevo mas escrevo. Tempos houve em que te chamava “naval” e, porque naval te confiei a minha alma de água e sal. Faz tanto tempo …

Sabes
hoje almoçava e, sem que me desse sequer conta, uma lágrima traiçoeira desenhou teu nome em minha cara. Como uma gota de seiva na casca enrugada de meu rosto_árvore. Sulcou-me ácida. Beijou-me a boca. E de novo, na doçura das searas depois das tempestades, voltaste e ali ficaste a sorrir à minha frente. Meu mar, meu mar menino. Senhor do meu destino.

E porque chegaste, larguei o prato, intacto (como me recrimino, há tanta fome no mundo…). Maquinalmente icei a vela do meu barco. Bebi a água inquinada dos esgotos por onde me perdi, escrevi palavras no corpo das vagas, epigrafei as pedras de um jangada e, de mansinho, parti!
"Correspondência ao mar"...
Olho agora a carta, esta. Sinóptica. Abrevio a chegada. Olho o Bugio: Um barco rompe na linha de cabotagem.
Alinho os óculos, miope não vejo nada …

“𝕮𝖗ó𝖓𝖎𝖈𝖆 𝖉𝖊 𝖚𝖒 𝖈𝖍𝖆𝖕é𝖚”

“… palerma, chapéus há muitos”… Haver há, de certeza absoluta. Nem contesto. Mas não são meus e nunca estabeleci com eles uma relação...